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Dra Geórgia Fonseca

O horror revisitado



Muitas pessoas se chocam ao ver na internet a foto de duas crianças com deficiência, em camisas de força, atadas à um radiador. Essa foto representa somente uma pequena parte do que foi, e do que ainda é em muitos locais, a história do tratamento das doenças mentais e da própria psiquiatria.

A foto em questão foi tirada há quase 2 décadas num asilo em Deir alQamar, uma aldeia ao sudeste de Beirute, no Líbano ( E imagine como seriam as condições de tratamento nesta localidade, nesta época) Se ela te choca talvez seja porque você não conhece a história de horrores que a deficiência física e mental enfrenta desde os primórdios da humanidade. Uma história de horrores, de punição, de abandono.

No entanto, se a conscientização e o cuidado humanitário vêm aumentando nos nossos dias, se as políticas de desinstitucionalização logram cada vez mais êxito, muitos tratamentos que vejo serem impostos aos autistas e outras pessoas com deficiência hoje em dia, mesmo dentro dos próprios lares, se assemelham muito aos praticados nestes tempos evos. Isto sim para mim é chocante!

Muitas vezes, ao estudar a história da psiquiatria e me deparar com os ditos "tratamentos" que eram propostos, minha mente corre rápidamente para fazer associação com algumas práticas atuais que são, na verdade, apenas a "releitura" do que se fazia antes com uma fachada mais "humanizada".

Então, antes de contar essa estória macabra(Eu eu o farei em breve), faço minha comparação pessoal e a aceite quem quiser. Porque para mim:

-As câmaras sudoríferas de antes, são a sauna e o detox de hoje;

-As punições são as terapias aversivas e reforçamentos negativos de antes. Ver as crianças apenas como animais treináveis entra na mesma filosofia;

-Os purgativos, enemas e vomitórios são a versão antiga dos tratamentos de detoxificação, desvermifugação e higienização a que muitos submentem as crianças, até em seus próprios lares, numa invasão de seus corpos que para mim, continua abuso;

-As câmaras de aprisionamento viraram câmaras de oxigênio;

-A tentativa de eliminar metais tóxicos do corpo das crianças é a forma moderna de exorcismo;

-Os choques elétricos, embora ainda existam, também se travestiram em terapias de neuromodulação e neurofeedback.

E por fim, o coquetel de drogas que se enfia goela abaixo das crianças, são a aliança profana entre a indústria farmacêutica, a medicina, as autoridades de saúde e a população, que deseja continuar mantendo nossas pessoas com deficiência "escondidas". Agora não mais em porões ou sótãos, mas sim carregando a máscara de placidez que não incitará mais a ficarmos incomodados ou constrangidos, ao descobrirmos que deficientes somos todos nós.

Paz e luz

Dra Geórgia Fonseca


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